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Sala de Jantar

As minhas receitas, as receitas de outros e umas deambulações pela gastronomia. Sabores com memória, sabores para partilhar.

Sala de Jantar

As minhas receitas, as receitas de outros e umas deambulações pela gastronomia. Sabores com memória, sabores para partilhar.

Da Senhora da Graça às Mercês, ou de como assistir o divino nas alturas cultivando o profano cá por baixo.

Maurício Barra, 14.10.13

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Tiveram lugar, em Almoçageme, as 245 ª Festas da Senhora da Graça. Duzentos e quarenta e cinco anos  em que a comunidade de Almoçageme comemora e comemora-se. Durante cinco dias coexistem uma festa profana de agradecimento divino, uma procissão devota que percorre toda a vila, uma festa que encerra o ano agrícola e o fim da época estival, juntando-se assim na mesma data as tradições milenares e as comemorações religiosas. Os proventos obtidos pela Festa são sempre para oferecer para fins de solidariedade definidos pela própria população.

Com a presença de toda a população e de muitos forasteiros, junta à comemoração religiosa a presença da Banda Filarmónica de Almoçageme, a Guarda de Honra dos Bombeiros Voluntários, conjuntos de baile, a banda das arruadas, o restaurante da Adega, quermesses e divertimentos para as crianças, o espectáculo de fogo-de-artifício e, para não variar, as cavalhadas, um jogo normalmente realizado por crianças e adultos dos sexo masculino, que consiste em retirar, sempre em circulação, com uma seta de madeira uma argola de uma gaiola, sem a deixar cair no chão até o jogo acabar. E a entrega da vitela ganha no sorteio das rifas.

 

A historiadora Maria Teresa Caetano, em conjunto com Joaquim Leite, produziu uma edição, completa e definitiva, sobre a origem e usos da Festa da Nossa Senhora da Graça, que têm lugar em Almoçageme desde 1758. Neste artigo apresentamos, retirado do livro, a origem desta tão antiga festividade.

« Num reconhecido júbilo pelo facto de o violento sismo do dia de Todos-Os-Santos de 1755 não ter provocado senão danos materiais, deu-se início à construção, numa terra de semeadura, de uma Igreja consagrada a Nossa Senhora da Graça [ ] a documentação subsistente esclarece que o templo " teve seo principio em o anno de 1758 feitos Com esmolas dos moradores do ditto logar, e dos nasionais delle, existentes em a Cidade de Lixbo e de outras pessoas devotas, sendo seo director, administrador, e maior de Votto Joze Gomes da Costa". Dez anos depois, celebrou-se a primeira missa no novel templo, a 15 de Agosto. E, alguns meses mais tarde, a administração da Igreja foi entregue - por Maria da Apresentação, viúva do administrador que fora "Deus servido chamalo para si á tempo que a ditta Igreja, se achava já coberta de telhado, e fechada de portas " - aos habitantes da aldeia conforme se pode ler no citado "Livro da Receita e despeza das obras de Nosa Senhora da grasa ". E a belíssima imagem da Virgem invocada foi, segundo a tradição oral, oferecida como pagamento de uma promessa de um conterrâneo que em viagem marítima, do Algarve para Lisboa, se salvou de um temporal à entrada da barra do Tejo.[]

Com a Graça da Senhora, deu-se início , ainda no séc. XVIII, numa terra aonde não acudia qualquer romagem, à festa em seu louvor : " Devesse solenizara Senhora da Graça no primeiro Domingo de Outubro Dominga Santíssimo Rozario [] O fervor mariano, espelhado nesta renovação de fé,, acabaria por ditar o abandono e sequente ruína da ermida manuelina devotada ao apóstolo André, que estava a cargo do "Ouvidor das Terras da Raynha", da qual apenas subsiste gracioso cruzeiro maneirista.

Pouco se sabe, no entanto, acerca dos primórdios dos festejos pois a - rara - documentação subsistente não é esclarecedora quanto à estrutura desta celebração mariana, nem, tão pouco, nos informa acerca de uma das mais interessantes particularidades desta que se subsume na razão de ser feita apenas por indivíduos ( recém ) casados, que, por um dois anos depois de celebrado o matrimónio, são convidados a "fazer a festa". Esta participação assumia-se - e assume-se ainda hoje - como verdadeiro "rito de passagem", porquanto a festa da Nossa Senhora da Graça era, na verdade, pela sua estrutura organizativa, a assunção da "maioridade" plena dos jovens casais. [ ] Outro aspecto a salientar prende-se com a necessidade de garantir a sua continuidade ao obter-se, ainda mesmo antes do término do evento, a formação de uma comissão para o ano seguinte. E poderá, talvez, radicar aqui uma das razões pelas quais esta festa - segundo se diz- nunca tenha ficado por fazer.

De igual modo eram formulados os convites ao juiz e à juíza da festa, por norma pessoas social e economicamente bem posicionadas, que tinham como função presidir aos festejos - em particular, à procissão -e, em contrapartida, ficavam "obrigados" a " dar uma esmola gorda". [ ] Assim, no sábado, os festeiros iam - e vão ainda - à casa do juiz entregar o pendão e a medalha e , seguidamente, à da juíza oferecer uma outra medalha. E, no Domingo, os festeiros acompanhados pela banda e por homens que transportam as gigas, forradas com " lindos lençóis ou toalhas de linho e enfeitadas com flores naturais, iam à casa do juiz e da juíza para os cumprimentar " e conduzir à Igreja para, em lugar destacado, presidirem à missa e, depois, à procissão, na qual o juiz - acompanhado pela juíza - carreava a bandeira da Senhora. As gigas eram benzidas durante a missa e dali levadas para o sítio do arraial onde se vendiam os bolos. Nesta altura, os bolos da festa "não eram comprados, eram os festeiros que levavam o trigo ao moleiro. Com a farinha moída faziam os bolos da festa e a cada fornada terminada era lançado um foguete " e aqueles que andavam nos campos, a trabalhar, "sabiam que tinham saído mais bolos".

Por este tempo a festa era " feita pelos fazendeiros, depois é que começou a ser feita pelos que andam à jorna ", de modo a que os eventuais prejuízos causados pela chuva outonal que, muitas vezes, "estraga a festa" fossem prontamente cobertos. Era também frequentes festeiros competia, para além da organização do evento, zelar pelo "ouro" da Nossa Senhora da Graça. Este "ouro" , bem como os excedentes monetários da festa, era guardado num cofre de madeira chapeado e ferrado - a burra - que era, secretamente, entregue a um dos festeiros. A burra tinha três chaves que eram distribuídas por outros tantos festeiros, garantindo-se, deste modo, que a abertura do cofre só era possível na presença daqueles elementos da comissão.»


 

 

 

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CARNE DAS MERCÊS 

 

Uma das vitualhas que são parte integrante dos cardápios desta Festa é a famosa Carne das Mercês, localidade vizinha que apadrinhou um prato que é comum a toda a região saloia a ocidente de Lisboa.  Pelos dias de hoje a sua confecção anda pelas ruas da amargura : fritam a carne do porco e chama-lhe o que não lhe devem chamar. Recorro ao grande Luís Pontes e trago-vos o que lhe se oferece dizer sobre a sua verdadeira confecção.

 

A verdadeira receita da Carne das Mercês 

A Feira das Mercês, antiquíssimo vestígio do culto popular do Divino Espírito Santo, realiza-se nas duas últimas semanas de Outubro, numa quinta que foi casa do Marquês de Pombal na zona saloia, entre Rio de Mouro e o Algueirão. 

A Carne às Mercês é um dos poucos “confitados” (há mais 4 ou 5 na cozinha tradicional portuguesa, geralmente não identificados como tal) da nossa cozinha popular e não tem nada a ver com as “carnes às mercês” das tabernas e cervejarias lisboetas, essas sim carnes de porco fritas (bem ou mal) e em tudo iguais, excepto na massa de pimentão, à carne de porco alentejana (sem amêijoas). 

Bom, como parece que ninguém se lembrou de fixar a receita antiga de Carne às Mercês, eu corro o risco de ser o único a poder fazê-lo e fá-lo-ei aqui que este é um petisco bom demais para se perder. 

 

Ingredientes:

 

1kg de rabadilha de porco

 

1 colher de sopa de pimentão em pó

 

5-6 dentes de alho

 

5-6 folhas de louro

 

Sal grosso e pimenta preta

 

150g de banha de porco

 

2,5dl de vinho branco

 

2 colheres de sopa de vinagre (facultativo*)

 

 

 

Preparação:

 

Corte a carne em pedaços com a volumetria aproximada de uma noz, tempere-os, junte o vinho e o vinagre* e deixe por 24 horas (mas melhor por 48h) no frigorífico*. 

Ponha esta carne com a marinada numa assadeira ou frigideiras de barro, por cima coloque a banha e leve ao forno, regulado para 120ºC com calor por baixo, durante cerca de 4 horas. 

Durante este tempo a carne mal fervilha e a película de banha que se forma sobre a marinada impede a sua evaporação. 

Isto é essencial para que a carne vá confitando lentamente, adquirindo aquela tenrura não-desfeita que só a baixa temperatura e o tempo conferem. 

Depois destas horas é tempo de finalizar: é agora que a carne já confitada vai ser frita. Passe a temperatura para 250ºC ou, mais prático, passe a assadeira para o lume do fogão, forte, e deixe que a marinada se evapore por completo e a carne fique alourada e frita por fora, mexendo sempre. 

No final (cuidado para que os alhos não queimem) junte um golpe de vinho branco, agite para desglaçar os sucos caramelizados e evaporar o álcool e sirva acompanhado de um bom vinho e pão de Mafra.

 

Luís Pontes em Outras Comidas


Butter chicken ou murgh makhani

Maurício Barra, 17.08.13

 

 

Motivado pela minha amiga M. , decidi fazer uma incursão por uma receita tradicionalíssima indiana mas que, num país ainda limitada em comida indiana, andamos sempre pelos currys e tandooris, esquecendo que a Índia é um continente com uma diversidade gastronómica idêntica à que vai dos Urales ao Cabo da Roca. Esta receita, muito comum nos lares indianos, deverá ter tantas as adaptações como quem as confecciona. Neste caso, tive em atenção a receita que M. me indicou, pesquisei e "construí" a minha própria versão.

O nome "galinha amanteigada" poderá afastar, logo à cabeça, a curiosidade de bastantes por esta receita. Mas resulta que, como em muitas coisas da vida, são "mais as vozes do que as nozes", e não resulta da sua confecção um sabor amanteigado da mesma. Aliás, a manteiga, nesta receita, tem a função de transformar em sedosa uma complexidade de sabores muito agradável.

Eis a minha versão.

 

Ingredientes :

galinha ou frango cortado aos bocados

arroz basmati

manga

 

Para marinar a galinha ou o  frango:

1/2 colher de chá de garam-masala ( se não encontrar,  pode usar Tikki Masala em pasta )

óleo de sésamo

sumo de limão

sal

pasta de alho e gengibre

 

Para o molho:

cominhos

pimenta vermelha

cebolas

alho

gengibre

paprika ou colorau

tomate fresco maduro

yogurte grego natural sem açucar

coentros

cardamomo ( opcional )

castanha de caju ( opcional )

 

Preparação:

Juntar à galinha todos os ingredientes da marinada num recipiente. Misturar bem. Deixar marinar no frigorífico um bom par de horas ou de um dia para o outro.

Numa frigideira grande com tampa ( alemã) leve a fritar os pedaços da galinha em óleo de milho com manteiga. Retirar do fogo quando estiverem dourados, antes de estarem completamente cozidos por dentro.

 

Entretanto já preparou o molho, juntando todos os ingredientes referidos, num liquidificador ( se for Bimby, é velocidade 7 durante 10 segundos ), até ficar com uma consistência líquida mas ainda pastosa.

 

Junte o molho à galinha e deixe ficar a refogar lentamente, em fogo baixo, até esta estar tenra.

É neste momento que decide qual o grau que quer para "amanteigar"  a sua receita, provando e medindo a quantidade que quer juntar ( ou não ) para ficar a seu gosto. Aqui também há quem junte natas líquidas ( influência da versão inglesa ) : eu não o fiz, porque prefiro adicionar mais yogurte grego ao molho antes de cozinhar do que adicionar natas a um sabor que neste ponto está no seu esplendor.

 

Sirva com arroz basmati cozido em farta água temperada com pouco sal e salsa ( dez minutos e escorrendo imediatamente para o arroz ficar solto ) e manga cortada em tiras.

Vão de Costeletas de Porco . . . iguais ao Barbecue.

Maurício Barra, 10.08.13

 

 

No Verão apetece os barbecues. Mas nem sempre é possível. Esta receita canadiana substitui muito bem o grelhado em fogo vivo. É muito fácil e incorpora dois sabores que juntos são mágicos : a carne de porco e o sabor agridoce.

 

Ingredientes:

ketchup

mel

molho worcestershire

 whisky

pimenta

paprika

 vinagre

açúcar amarelo

 

Preparação:

Cozer em água as costeletas em água temperada, até os ossos começarem a destacar da carne. Retire.

Preparar o molho: junte todos os ingredientes e emulsione. Cobrir com este molho toda a carne. Levar ao forno durante 20 minutos, pincelando a carne com o resto do molho da marinada duas ou três vezes.

 

Retirar, aspergir com açúcar amarelo e levar ao grelhador do forno para caramelizar.

Acompanhe com esmagado de batata temperada com azeite, cebola picada e salsa. 

Costeletas de Borrego com Couscous e Legumes Refogados em Açafrão

Maurício Barra, 20.07.13

 

 

Hoje deu-me para isto. Com o litoral oeste atlântico submerso nestas neblinas matinais que nos refrescam o Verão, o apetite conduz-nos ao desejo de comidas estivais, mas com alguma substância, não vá a neblina quedar-se e a lassidão “nel primo pomeriggio” ficar obliterada por insuficiência solar.

Este prato para mim é um clássico que repito amiudamente.

 

Ingredientes:

Costeletas de borrego

Limão

Molho Inglês

Mostarda ( opcional )

Farinha ( opcional )

Couscous

Óleo de Sésamo

Louro

Cenoura

Courgette

Cebolas mini

Pimento vermelho

Grão ( opcional )

Azeite

Piripiri seco

Açafrão

Sal

 

Confecção :

Descasque e corte a cenoura em triângulos. Lave e corte a courgette em triângulos. Descasque as cebolas. Corte os pimentos em quadrados. Coloque todos os legumes numa frigideira com tampa e deixe refogar lentamente em azeite temperado com piripiri seco e açafrão, de modo a que os legumes libertem os seus sucos gerando um molho, o qual não vai deixar que reduza demasiado. Prove e, sendo necessário, acerte o sal.

Ferva água com uma folha de louro e sal. Coloque o couscous num recipiente, tempere-o com sal e óleo de sésamo, cubra com a água fervida, mexendo lentamente para o couscous abrir, adicionando mais água se necessário ( este é o processo rápido ; se quiser seguir o procedimento dos nossos vizinhos do outro lado do Mediterrâneo, coza o couscous em vapor ).

Tempere as costeletas de borrego com sal, pimenta, molho inglês e mostarda ( opcional ). Passe-as por farinha  ( opcional ) e frite-as em azeite bem quente, de modo a que fiquem tostadas por fora e retenham os seus sucos no seu interior.

Sirva os três conjuntos em separado, para que cada comensal elabore no seu prato as ligações de sabor que preferir.

 

Desta vez acompanhei com uma sangria branca de Senhor da Adraga ( Caves Santa Maria, Colares ) com hortelã e maçã verde.

 

 

 

 

Açordas e Migas

Maurício Barra, 13.07.13

 

 

 

 

Comecemos pelas Migas.

As migas são um assunto religioso, exigem devoção, não obrigação. Num país "pãozeiro" onde, de Norte a Sul, sem esquecer Madeira e Açores, o pão é alimento preponderante - e, diga-se, de excepcional qualidade média, qualidade que a tanto abrigou as grandes superfícies a reinventar padarias para  não perderem um grosso filão de consumo que despreza o pão industrial - em diversas e saborosas composições gastronómicas. Obviamente , quem tem mais sorte é quem escapa à ditadura dos contextos fortemente urbanos. Sorte que não é difícil obter considerando que, no que ao pão diz respeito, fica invertido a qualificação do termo que diz que o país "é Lisboa e o resto é paisagem". Aqui a "paisagem" é que manda.

Mas é no Alentejo que, ao pão, dão tratamento de rei. Nas sopas. Nos ensopados. E nas migas.

Conversando com alentejanos, a explicação que dão, para além da origem pobre e rural de parte de uma gastronomia que encontrou nos sabores singelos a substituição de condutos mais ricos, está a confecção do pão tradicional alentejano, de trigo, mais popular nos tamanhos de 1/2 e um kilo, feito com fermento "inteiro" que lhe proporciona um sabor , consistência e longevidade que não tem comparação com a rápida deterioração de outros tipos de pão. Havendo pão que dure, há que o aproveitar. E as migas são uma solução superlativa.

Hoje trago-vos duas receitas, que faço há muito tempo, que estão no coração do receituário alentejano. Em vez de vos apresentar as minhas variações, prefiro deixar-vos a receita autêntica, recolhida em pesquisa local efectuada no Alentejo.

 

 

MIGAS DE ESPARGOS

 

Ingredientes:

1 molho de espargos;

3 dentes de alho;

1 folha de louro;

3 ovos;

vinagre q.b.;

pimenta q.b.;

carne da calda fresca (carne de porco temperada com sal, alho e pimenta);

3 colheres (sopa) de banha de porco;

sal q.b.;

pão alentejano (de preferência duro).

Preparação: Cortar os espargos aos pedacinhos, pôr a cozer numa panela em água temperada com sal. Entretanto, num tacho, fritar a carne com a banha de porco. Depois de frita, retirar do tacho. Quando os espargos estiverem cozidos, escorrer e esmagá-los com a ajuda de um garfo. Deitar os espargos esmagados numa pequena tigela, juntar os ovos inteiros, os pedacinhos de carne frita, o vinagre e a pimenta. Rectifica-se o tempero com um pouco de sal (se necessário) e pimenta. Bater tudo junto. A seguir, desfazer o miolo do pão e cortar as côdeas em pedacinhos. Colocar novamente o tacho na chama e fritar, em banha de carne, os dentes de alho e a folha de louro. Juntar o pão e mexer com a ajuda de uma colher de pau. De seguida, juntar o preparado dos espargos, mexer com a colher, sempre sobre chama branda, até as migas ficarem secas. As migas de espargos devem ficar secas e soltas. Este prato serve-se quente ou frio acompanhado pela carne.

 

 

MIGAS GATAS

 

Ingredientes:

uma cabeça de alho,

uma posta de bacalhau,

pão alentejano (duro),

Sal q.b.,

azeite

Preparação: Coza a posta de bacalhau depois de previamente demolhada. Enquanto isso descasque o alho e pique-o, corte o pão em pequenas fatias, muito finas.Coloque o pão já cortado numa tigela grande ou numa terrina, desfie o bacalhau e coloque em cima do pão, assim como alho já picado, o sal (a gosto) e o azeite, despois regue tudo com a água do bacalhau ainda a ferver. Com a colher de pau, envolva tudo muito bem, para que o pão fique bem ensopado.

 

 

 

 

 

A partir d'aqui, o texto não é meu. Publicado no Rerum Natura ( quem diz que a ciência é ascética não conhece cinetistas ), faço questão dar a palavra a Galopim de Carvalho, o “pai dos dinossauros”, emérito professor de geologia, amador gastronómico com obra publicada, que sobre açordas e migas diz tudo.  E estas referências devemos respeitar.

 

«Terra de grandes barrigas

onde só há gente gorda.

Às sopas chamam açorda,

à açorda chamam-lhe migas.»

 

« Foi com estas coplas que, na revista «Palhas e Moínhas», o poeta alentejano João Vasconcelos e Sá, nos começos do século passado, cantou a diferença entre os usos destas palavras no Alentejo e fora dele; hoje mais conhecidas graças à bela interpretação do seu neto, o fadista António Pinto Basto. Estreada em Évora, em 1939, esta representação musical, em dois actos, tem por tema a mais extensa província de Portugal, as suas gentes e o seu modo de estar e viver naquela época. Entre os muitos participantes, todos recrutados entre a população da cidade, figurou o meu irmão Francisco José que, logo aí, revelou as suas excepcionais qualidades como intérprete da canção.

 

No seu livro, “Para uma História da Alimentação no Alentejo” (1997), o saudoso Alfredo Saramago revelou-nos que, durante o período de ocupação romana, se comia no Alentejo uma sopa feita de ervas aromáticas, alho, azeite, pão e água bem quente. Esta confecção atravessou as culturas dos povos invasores que se seguiram, tendo sido os árabes que a fixaram e lhe deram a importância que teve entre eles e ainda tem entre nós. A ath thurda (açorda) é, pois uma herança antiga, valorizada pela presença muçulmana neste Garb al Andaluz, entre os séculos VII a XIII.

 

As açordas do pobre não têm acompanhamento. São as açordas de mão no bolso (como já escrevi noutro local) comidas pelos mais carenciados que, não tendo conduto, só precisam da mão que leva a colher à boca. São as açordas peladas, não fazem mal nem bem, é só pão e água... caem nas calças e não põem nódoas, escreveu Falcato Alves, em “Os Comeres dos Ganhões” (1994).

Mas há também, para quem pode, açordas bem temperadas, feitas com a água de cozer bacalhau, pescada ou amêijoas, e com outros produtos de grande valor nutritivo e requintado paladar, com destaque para os ditos condutos e, ainda, o ovo cozido ou escalfado, as azeitonas e, até, nalgumas famílias, os figos frescos. Açordas são quase sempre as de alho e coentros ou de poejos.

À falta destas ervas há quem as faça com pimento verde esmigalhado no almofariz (no geral, de madeira), ou graal, como nós dizemos. Mas há outras, como as de tomate e muitas mais, a ponto de o termo ser considerado sinónimo de “sopas de pão”.

 

Para nós, alentejanos, o termo migas designa um alimento à base de pão migado, embebido num caldo e a seguir esmigalhado e amassado. Esta confecção é aquilo que, em Lisboa e noutras regiões do país, se chama açorda. As ”açordas de marisco”, as boas e as menos boas, que se servem de Norte a Sul do país, são, na realidade, migas, pois correspondem melhor à etimologia e ao significado da palavra.

Temos ainda as migas de batata, também elas esmigalhadas e amassadas. Assinale-se aqui, porque nunca é demais saber, que migas e mica, o mineral, radicam no mesmo étimo latino, mica, que significa migalha.

As migas da minha mãe, trazidas de casa da mãe dela, eram quase sempre feitas no pingo do toucinho ou da carne de porco com mais gordura e no dos enchidos.

Ao contrário do ditado que reza «migas de pão, duas voltas e já estão», as nossas velhas migas as que ainda hoje se fazem no Alentejo são enroladas na sertã, continuamente, até tostarem levemente e ganharem uma casquinha estaladiça. Prato tradicional e frequente na mesa de ricos e pobres, com a diferença de que as migas de uns tinham mais carne magra e linguiça, e as de outros, mais toucinho e farinheira.»

 

Coelho Frito da D.Cândida da Peninha

Maurício Barra, 01.06.13

  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Luís Pontes, a cujo blog Outra Comidas sou devotado, escreveu  sobre um coelho, mais apropriadamnete o Coelho da D. Cândida, que, com o marido, durante muitos anos foram os “caseiros” da Peninha, hoje em mãos universitárias coimbrãs. Sendo assunto “ à porta da minha casa “, peço indulgência ao autor para aqui reproduzir a sua descrição da receita, como forma de a preservar para futura memória destas aldeias ocidentais do Monte da Lua.

 

COELHO FRITO da D.CÂNDIDA DA PENINHA

 

« Por muitos anos foi visita assídua, quase uma peregrinação que se cumpria com alegria e gula, ao último morro da Serra de Sintra antes desta mergulhar no mar, no Cabo da Roca, a Peninha, com a sua capela algo sinistra cheia de ex-votos de cera amarelada pelo passar dos anos e o palácio do Monteiro, o mesmo da Regaleira, que ficou inacabado no início do sec. XX e que acabou vagamente administrado por uma fundação coimbrã, que, diga-se, não parecia ter grande vocação para administração de património.

Estas visitas não eram, no entanto, motivadas por qualquer devoção à Senhora do local ou ao palacete romântico arruinado, mas sim pelo queijo e pela amizade que o tempo e circunstâncias peculiares cimentaram com D. Cândida e o seu marido Silvino, guardas do palacete e residentes nuns casebres no sopé do enorme penhasco de granito encimado pelo palácio, seria talvez mais próprio chamar-lhes eremitas, tal era a dureza da vida que ali se levava, só eles, o vento, o nevoeiro, os cães e o rebanho de cabras, como se o tempo tivesse sido ali misteriosamente suspenso uns séculos antes.

A D. Cândida fazia os melhores queijos que alguma vez comi e, desses tempos bons, dessas conversas, dessa amizade, dessas vidas suspensas, ficaram um sem fim de recordações e histórias, umas contadas, outras vividas, às vezes à volta de um petisco que ali se armava, uns queijos, vinho, uns torresmos, o bom pão da Azóia e, por vezes, um mítico coelho frito, caçado ali na serra pelo Silvino e transformado num sabor único que eu tento emular agora, mais de vinte anos passados sobre a partida do casal, finalmente vencidos pelos anos, pela doença e pela solidão.

Os mitos são cruéis e invencíveis e claro que eu nunca consegui igualar o coelho frito da D. Cândida. Tento fazê-lo agora como ela fazia, e apesar de ficar sempre algo abaixo da recordação, é um prato, ou um petisco muito, mas mesmo muito bom.

 

Ingredientes:

Coelho

Banha

Alhos (uma cabeça)

Louro

Sal e pimenta

Vinho branco

Coentros ou salsa

 

Preparação:

Parta o coelho em pedaços não muito pequenos, salpique apenas com sal e deixe tomar sabor por uma ou duas horas, após o que o frita na banha com lume enérgico, sem qualquer tempero, até que se apresente bem tostado por todos os lados. Junte então os alhos esmagados, louro e pimenta, frite um pouco e molhe com um gole de vinho branco.

A partir de agora, o coelho frito vai decorrendo neste ciclo: um pouco de vinho para desglaçar os caramelos que se formam quando os aquosos se esgotam, mais vinho de novo quando preciso, pouco de cada vez para que o sabor se acentue sempre.

Cerca de quarenta minutos depois (uma hora se for coelho bravo), junte uma última vez o vinho e desta vez, também um punhado de coentros ou salsa, picados. Pessoalmente, gosto mais dos coentros, se bem que D. Cândida usasse quase sempre salsa, que os coentros eram uma raridade na serra, naqueles anos.

Dê mais uma volta rápida e está pronto para ser servido como refeição.

Ou deixe arrefecer e coma frio, como petisco, nos dias seguintes.»

(*) texto, receita e fotografias de Luís Pontes in Outras Comidas

Costeletas com Stout e Mel

Maurício Barra, 18.05.13

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

COSTELETAS COM STOUT ( CERVEJA PRETA ) E MEL

Em Portugal as costeletas de porco grelhadas são uma espécie de porreirismo nacional, sempre a mesma coisa. Só grelha e sal. Um desconsolo.

Proponho uma receita de origem canadiana - lá usam o syrup de ácer em vez de mel - para dar algum contexto gastronómico a este nariz de cêra nacional.  

 

Ingredientes

cerveja preta ( stout )

caldo de galinha

cebola picada

dentes de alho, descascados

folhas de louro

tomilho seco

sal e pimenta moída na hora

vão de costelas de porco

 

Molho:

mel

mostarda Dijon

molho de Tomate

dentes de alho, picados

cominho

coentro finamente picado

cebolinho fresco picado

salsa fresca picada

 

Num tacho, leve para ferver o caldo de galinha com a cerveja, cebola, alho, louro, tomilho, sal e pimenta preta.

Coza o vão das costeletas lentamente até a carne ficar macia. Enquanto isso, misture os ingredientes restantes num recipiente.

Retire as costeletas e seque-as com um pano limpo. Barre-as com molho obtido de todos os lados e reservar o resto.

Reduzir o calor do churrasco para médio-alto. Grelhe as costeletas com o molho cerca de 15 minutos, pincelando sempre que necessário, até que a carne estiver tostada.

Cortar as costeletas uma a uma e colocar no prato de servir.

Sirva com esmagado de batata ( batata cozida com a pele, despelada, temperada com cebola picada, pimenta preta e azeita ) e  legumes grelhados na churrasqueira.

Empadas, empanadas, pasties e pies.

Maurício Barra, 11.05.13

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

EMPADAS, EMPANADAS, PASTIES, PIES

 

Quando se descobriu que qualquer tipo de pão fazia um bom conjunto com qualquer tipo de carnes e molhos, a criatividade aliada ao  prazer dos sabores acabou por criar a sua capicua : e porque não a carnes confeccionadas rodear de massas que nascem da farinha e água.  Daí a etimologia da palavra empada, uma simplificação para a palavra empanada, termo que ainda hoje se usa em terras do nosso vizinho ibérico, e terá origem no latim panis ( pão ).

De origem secular e dispersos pelos quatro cantos do mundo, os antigos pastelões, hoje chamados empadas em Portugal, estão nas nossas mesas pelo menos desde a Época Medieval. Desde esse tempo vêem os pastelões portugueses, que consistiam em grandes tortas salgadas, com recheios diversos Mais tarde, no século XIX os pastelões pequenos eram conhecidos como empadas de caixa. Tradicionalmente era um recurso usado nos dias prescritos de abstinência de carne, em que eram servidos como refeições. O que, em querendo, permitia que a abstinência viesse escondida para a mesa.

Existem milhares versões por esses mundo fora. Desde as famosas Cornish Pasties ( com um recheio em que a batata é elemento essencial ), que começaram por ser refeição tradicional dos mineiros da Cornualha, às Shepherd's Pies ( no Reino Unido os pastelões fazem parte da cozinha familiar quotidiana ), às empanadas sul-americanas ( nas mais típicas, o recheio consiste de carne cortada em pedacinhos bem pequenos, batatas em cubinhos, cebolas, azeitonas e passas de uva, tudo isso embebido em uma generosa quantidade de manteiga ), até às Pies americanas com os mais diversos recheios ( dôces e salgados ) que, decerto, os Pilgrimm Fathers devem ter levado para o Novo Mundo.

Mas fiquemos por terras mais próximas.

Em Espanha as empanadas galegas são um marco incontornável, tal como o são as empadas alentejanas em Portugal, ambas consumidas, tanto como refeição, como de iguaria miniaturizada a servir de apoio a uma ida à pastelaria ou a barra ( balcão ).

São precisamente estas duas versões que vos trago. Não as assumam como substitutos do que podem facilmente comprara em qualquer lado. Sigam-nas como uma boa refeição de família,desde que as façam com as dimensões adequadas.

 

EMPADA DE GALINHA COM MASSA QUEBRADA

A receita "tem" de ser de Alfredo Saramago, o qual recolhe o procedimento base mais tradicional, sobre o qual, se inventam as mais diversas variações. Vejamos o que o "mestre" nos diz.

 

« Deixe uma galinha em infusão, durante um dia, em água temperada com sal e com uma cebola cortada às rodelas, um ramo de salsa, um copo de vinho branco, uma colher de sopa de vinagre, uns grão de pimenta preta, um cravinho, um cheirinho de noz moscada e um ramo de manjerona.

No outro dia coza a galinha nessa infusão e junte 200 gramas de toucinho e uma linguiça. Depois de muito bem cozida, retire a galinha, Desosse-a completamente e passe o caldo por uma passador fino.

Para fazer a massa quebrada, misture 300 gramas de farinha, uma chávena de água onde cozeram as carnes da empada, uma colher de sopa de banha e outra de azeite.  Amassa-se muito bem e deixa-se a descansar a massa e só de tende passadas duas horas.Unte as formas com banha, forre-as com esta massa e ponha a carne de galinha, o toucinho cortado em fatias finas, a linguiça também cortada em pequenos troços e um pouco do caldo obtido.

Leve ao forno até que as empadas fiquem cozidas e douradas ».

 

EMPANADA GALEGA

Para esta receita recorri aos Caballeros de Santiago.

 

Ingredientes

Para a massa:

- 4 chávenas de farinha de trigo

- 1 chávena de azeite ( ou óleo )

- 1 chávena de leite

- Sal

Para o recheio

tomates

pimentões grandes

atum em azeite

cebolas grandes

gemas de ovos

 

Elaboração:

Amasse os ingredientes da massa e deixe repousar uns 30 minutos na geladeira.

Pique finamente as cebolas e refogue lentamente em azeite. Acrescente os tomates inteiros e os pimentões cortados em tiras e deixe cozinhar tudo suavemente durante 1 hora.

Dividir a massa em duas. Polvilhar a mesa com farinha, estender a massa deixando fina e colocar numa assadeira. Coloque o recheio já frio e em cima dele o atum escorrido espalhando por igual. Pintar com gema de ovos todos as bordas.

Cobrir com o resto da massa, fechando bem as bordas. Para fechar pinte com água.

Pintar toda a cobertura com a gema e prepare uns cordões com a massa para ornamentar.

Asse em forno durante 45 minutos, a 200° C os primeiros 15 minutos e o resto a 175° C.

Se fizer a regogado juntando um pouco do óleo do atum ficará mais saboroso.

Peridz : da Taberna ao Convento

Maurício Barra, 04.05.13

  

 

 

 

A semana passada, num dos jantares que reúne “ o grupo” que gerou a sua “ amizade eterna” em Económicas ( ao qual não pode comparecer um dilecto amigo ), por sugestão do L.H.S fomos à Taberna 1330, na LX Factory. Em boa hora aceitámos a sua sugestão.

Sob o comando do chef Nuno Barros ( que adquiriu e manteve justa fama com a antecessora Taberna, localizada em Oeiras ), a Taberna 1300 oferece um espaço muito agradável, bem dimensionado, com uma atmosfera que, de algum modo, recupera a aura das antigas fábricas industriais que ali se localizavam no século passado. O serviço jovem e cordial ajustou-se ao clima trendy que os comensais figuravam.

A ementa criativa, cujo propósito é a reconstrução de receitas tradicionais com base em produtos portugueses, permitiu-nos navegar por caminhos alternativos de sabores que reconhecíamos. O agrado foi geral, desde as entradas às sobremesas, que particularmente surpreenderam todos.

Eu, tal como mais quatro dos comensais, escolhemos para prato principal as perdizes. Uma reconstrução das perdizes à “Convento de Alcântara “, de acordo com o descrito pelo chef no próprio cardápio. É sobre esta confecção que vos quero relatar o que retive da nossa apreciação.

Consiste esta versão da Taberna num caldo de perdiz, onde navegam, entre outros atavios, rolos de peito de perdiz abraçando os seus fígados e um triangulo gelatinado da redução clarificada de essência do referido caldo. Como acompanhante, apartado, luzia um croquete redondo e abastado de perdiz desfiada. O sabor intenso a perdiz, que rescendia em todo o preparo, permite assegurar que a andarilha não era de capoeira.

Para quem conhecia a verdadeira receita do “ Convento de Alcântara” foi uma relativa decepção. Não em relação à confecção em si, primorosa e com elevado grau de tecnicidade culinária, mas em relação à reconstrução de um prato que defraudou a memória do sabor esperado desta receita com mais de um século.

Por isso é que a gastronomia é o mais democrático dos prazeres. A  mesma confecção tem tantas avaliações quantas as pessoas que o saboreiam. Casa pessoa encerra em si uma matriz que amalgama todos os contextos e circunstâncias da sua vida, construindo memórias de degustação que desaguam na sua forma única de apreciar. No meu caso, no confronto entre a minha memória e a sua adaptação contemporânea, ganhou a memória. No caso do chef Nuno Barros, ganha ele todos os dias, com o seu restaurante cheio e com clientes satisfeitos. Como nós também o fomos,

 

E é precisamente em nome dessa memória que vos apresento hoje a receita original de

PERDIZES À CONVENTO DE ALCÂNTARA

 

É considerada por muitos como o único exemplo de receita portuguesa de alta cozinha. Segundo Oliveira Bello - gastrónomo e fundador, em 1933, da Sociedade Portuguesa de Gastronomia - no seu livro "Culinária Portuguesa", esta é a receita que Auguste Escoffier (1846-1935), grande chef francês, refere no seu "Guide de Culinaire". Consta que esta receita de perdiz terá sido encontrada pelos soldados de Junot, quando saquearam o convento de Alcântara em Lisboa. A Duquesa de Abrantes ( Madame Junot), tendo tido conhecimento da receita, transcreveu-a nas suas memórias, Escoffier descobriu-a e colocou-a no seu "Guide de Culinaire".

 

Ingredientes

3 perdizes

250 gr foie gras

100 gr trufas

2 garrafas vinho do Porto seco

60 gr manteiga

500 ml caldo de ave (caldo de perdiz de preferência)

sal

fatias de pão

 

Confecção

. Arranjam-se as perdizes e desossam-se com todo o cuidado, esfregam-se com sal.

. Recheiam-se com o foie gras e as trufas, partidas em pequenos pedaços, refazendo a forma original da perdiz.. Atam-se as perdizes e colocam-se em infusão (devem ficar bem cobertas) de vinho do Porto, durante 48 horas.

. Colocam-se as aves num tacho e vão a cozer no vinho da infusão, em lume brando, até ficarem tenras e com o molho reduzido e espesso.

. Depois de cozidas, colocam-se as perdizes numa caçarola untada com manteiga, sobre uma camada de trufas e regam-se com caldo de ave.

. Tapa-se bem a caçarola e vai ao forno durante 45 minutos.

. Dispõem-se as perdizes sobre fatias de pão ligeiramente fritas em manteiga e regam-se com o molho.

Servem-se quentes.

 

PS:  nunca as fiz com trufas, nunca as desossei, uma vez substitui as perdizes por pombos, e o Vinho do Porto nunca foi seco.

 

Lafões, Sintra e Açores : o périplo da Vitela Assada

Maurício Barra, 11.04.13

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

LAFÕES, SINTRA E AÇORES:

O PÉRIPLO DA VITELA ASSADA

 

Depois de sobre a Chanfana já ter elocubrado no passado, hoje debruço-me sobre uma confecção idêntica mas com a "vaca prima da cabra", Ou seja, carne do bovino, assada no forno, condimentada, lentamente. Estamos no domínio do slow-food , bem entendido.

 

A confecção do gênero mais conhecida em Portugal é a Vitela assada à moda de Lafões que, por terras do Vale do Vouga, é apanágio de superlativas amesendações.

A confecção é conhecida :

 

 

 

VITELA ASSADA DE SINTRA

A Vitela Assada de Sintra, obviamente, não poderia ser muito diferente. Tem diferença nos temperos, que não nos procedimentos e, infelizmente, cada vez se vê menos nas ementas dos restaurantes nestes territórios da antiga Xendra.

 

Ingredientes:

1 kg de ganso de vitela "de leite"

1 cebola

2 dentes de alho

1 colher de (chá) de colorau

2 folhas de louro

4 dl de azeite

100 gr de manteiga

2 dl de vinho branco

1 cenoura

1 ramo de salsa

cravinho de cabecinha

sal

pimenta

 

Confecção:

Tempera-se a carne com o sal, a pimenta, o cravinho, o colorau, o alho esmagado, o louro, o vinho branco e a salsa.

De seguida, coloca-se o ganso de vitela numa assadeira com a cebola e a cenoura cortada aos pedaços, o azeite  e a manteiga.

Leva-se a assar ao forno.

À medida que for assando, volta-se a carne, de quando em vez, e rega-se com o próprio molho.

Quando estiver assada, retira-se do forno e serve-se com batatas assadas na própria assadeira.

 

 

ALCATRA DE CARNE DA ILHA TERCEIRA

É, entre estes assados, a que mais retenho na minha memória, de quando frequentei os Açores com alguma frequência por motivos profissionais. Nunca ensaiei a sua confecção ( não tenho acesso ao vinho morangueiro, que é como é baptizado  no continente o "vinho de cheiro" dos açoreanos ), por isso vos deixo com a receita de um terceirense que sobre a mesma tece os seguintes preceitos:

 

« Este é um prato típico açoriano, mais precisamente da ilha Terceira, que retrata muito bem a passagem das naus portuguesas nos Açores ,vindas da Índia e Américas no tempo dos descobrimentos, pois utiliza muitas especiarias, fazendo com que seja um prato muito aromático.

Esta iguaria confecciona-se num alguidar de barro tradicional e leva algum tempo a fazer, cerca de 3 horas ( se não tiverem a dito alguidar, não há problema, podem fazer numa panela de barro vidrado ).

Nota: Esta receita não tem medidas, primeiro porque existem dezenas de diferentes receitas espalhadas em vários locais da ilha Terceira, com as mais diferentes especiarias!

 

Ingredientes principais:

- Carne de Alcatra (Acém comprido com osso), quantidades a depender das pessoas.

- Um pedaço de chambão, com osso;

- Toucinho fumado;

- 4 a 5 cebolas médias cortadas à rodelas, dependendo da quantidade de carne;

- 2 a 3 dentes de Alho;

- Vinho de cheiro tinto;

- Um copo de água;

- Manteiga;

- Banha de porco;

- Sal.

 

Especiarias (as que eu uso):

- Pimenta da Jamaica em grão;

- Pimenta preta em grão;

- Pau de canela;

- Louro.

Opcionais e que pessoalmente acho que fica enjoativo (cada um tem os seus gostos);

- Cravinho da índia;

- Hortelã;

- Colorau.

 

Preparação:

Peguem no pote, coloquem as cebolas cortadas às rodelas, o alho picado, o toucinho a gosto (costumo colocar um pedaço de 400g, cortado às tiras), e o louro. Logo em seguida coloquem a carne(acém e chambão) previamente temperada com sal, grãos de pimenta preta e da Jamaica (eu coloco um grupinho grãos, dos dois tipos de pimenta, que agarro com as pontas de todos os dedos da mão).

Mistura-se com as mãos (bem lavadinhas) a carne, e depois de tudo misturado cheirem para ver se está suficientemente perfumado.

Por cima da carne coloquem duas colheres de sopa de manteiga e uma de banha de porco.

Depois destes passos, derramem o vinho de cheiro até quase cobrir a carne, e na folga que deixaram, coloquem um copo de água para traçar a intensidade do vinho de cheiro. Não é suposto a  carne ficar completamente embebida, a carne vai mirrar quando for ao forno e assim o molho vai acabar por cobrir a carne.

Hora de colocar a carne no forno a 250 graus, e se o vosso pote não tiver tampa, coloquem folha de alumínio.

Deixem entrar em fervura e cozinhar umas duas horas… Este tipo de carne é muito dura, e quando cozinhada a altas temperaturas, e durante longo período de tempo, fica tenra e saborosa.

Quando a carne ficar tostada em cima, tirem com muito cuidado o pote, e provem para rectificar temperos, se faltar sal, ponham mais, se faltar especiarias também. Virem a carne do avesso para não tostar demasiado de um lado.

Esta é uma receita que é preciso rectificar muito, até ficar ao nosso gosto.

Passadas estas duas horas, deixem a carne no forno apagado até ao dia seguinte (convém fazer este prato à noite para deixar para o dia seguinte), e assim a carne vai apurar mais os sabores e irá ficar mais tenra no molho. No dia seguinte, coze-se o resto e rectifica-se temperos outra vez.

Deverá ficar um molho castanho escuro e muito cheiroso.

E aí está! Acompanha-se com batata cozida, e massa sovada que nós aqui temos muito nos Açores.

Inhame também fica bem, e umas rodelas de ananás ficam a matar.»

( recolhida a partir de um blog generalista da ilha terceira )